Muitas ovelhas estão sobre o prado ondulado, pastando a basta erva. Três homens as estão olhando. Um deles é velho, já todo encanecido, os outros têm, um os seus trinta, e o companheiro seus quarenta anos, mais ou menos.
– Cuidado, Mestre. São mandriões… –aconselha Judas, ao ver que Jesus apressou o passo.
Mas Jesus nem lhe responde. E vai alto, bonito, com o sol poente lhe batendo no rosto, e com sua veste branca. Parece um anjo, de tão luminoso que está…
– A paz esteja convosco, amigos, Ele saúda, quando chega na entrada do prado.
Os três se viram, espantados. Há um silêncio. Depois, o mais velho pergunta:
– Quem és?
– Alguém que te ama.
– Serias o primeiro, depois de tantos anos. De onde vens?
– Da Galiléia.
– Da Galiléia? Oh!
O homem o olha atentamente. Os outros também já se aproximam.
– Da Galiléia –repete o pastor, e acrescenta em voz baixa, falando para si mesmo–: Ele também tinha vindo da Galiléia… De que lugar, Senhor?”
– De Nazaré.
– Oh! Diz-me, então. Terá voltado para lá um menino, com uma mulher chamada Maria e um homem chamado José, um menino ainda mais bonito do que a sua mãe, que flor mais bonita nunca se viu nas encostas de Judá? Um menino nascido em Belém de Judá, no tempo do edito? Um menino que fugiu depois, para a grande sorte do mundo. Um menino, que eu daria a vida para saber se ainda está vivo, se já é um homem feito!
– Por que dizes que foi a grande sorte do mundo o ter Ele fugido?
– Porque Ele era o Salvador, o Messias, e Herodes queria matá-lo. Eu não estava aqui, quando Ele fugiu com o pai e a mãe… Quando fiquei sabendo da matança, e voltei… — porque eu também tinha filhos (um soluço), Senhor, e uma mulher… (soluço) e ouvi dizer que estavam mortos (outro soluço), mas eu te juro pelo Deus de Abraão, por causa Dele eu tremia mais do que pela minha própria carne — fiquei sabendo que Ele tinha fugido, e nem pude fazer perguntas; nem pude ir recolher os corpos dos meus filhos degolados… Perseguido a pedradas, como se fosse um leproso, um imundo, um assassino… e precisei fugir para os bosques, levar uma vida de lobo… até que encontrei um patrão. Oh! Ana não existe mais… É duro e cruel… Se uma ovelha se aleija, se o lobo me pega um cordeiro, ou eu vou ser espancado até o sangue, ou vão tirar-me o meu pouco ganho, ou vou trabalhar nos bosques para os outros, fazer qualquer coisa, mas pagando sempre três vezes mais do que o justo valor. Mas não importa. Eu sempre tenho dito ao Altíssimo: “Deixa-me ver o teu Messias, deixa-me pelo menos saber que Ele está vivo, e tudo o que tenho sofrido é nada.” Senhor, eu te disse como fui tratado pelos belemitas e como estou sendo tratado pelo patrão. Eu podia ter retribuído ao mal com mal, ou praticar o mal, roubando, para não ter que sofrer com o patrão. Mas, eu só quis perdoar, sofrer, ser honesto, porque os anjos haviam dito: “Glória a Deus nos Céus altíssimos, e paz na terra aos homens de boa vontade.”
– Foi assim mesmo que os anjos disseram?
– Sim, Senhor, podes crê-lo Tu, ao menos Tu, que és tão bom. Fica sabendo Tu, pelo menos, e crede que o Messias já nasceu. Ninguém quer mais crer nisso. Mas os anjos não mentem… e nós não estávamos bêbados, como disseram. Este, que estás vendo, naquele tempo era um menino, e foi o primeiro a ver o anjo. Ele só bebia leite. Será que o leite pode embriagar? Os anjos disseram: “Hoje na cidade de Davi nasceu o Salvador, que é Cristo, o Senhor. E vós o reconhecereis pelo seguinte: Encontrareis um Menino deitado em uma manjedoura, envolvido em faixas.”
– Foi assim mesmo que falaram? Não tereis entendido mal? Não estareis enganados, depois de tanto tempo?
– Oh! Não! Não é verdade, Levi? Para não nos esquecermos daquelas palavras — e nem o poderíamos, porque eram palavras do Céu, e foram escritas com o fogo do Céu em nossos corações — todas as manhãs, todas as tardes, quando o sol surge, quando brilha a primeira estrela, nós as dizemos como oração, como pedido de bênção, para termos força e conforto, em nome Dele e da mãe.
– Ah! Vós dizíeis: “O Cristo”?
– Não, Senhor. Nós dizemos: “Glória a Deus nos Céus altíssimos e paz na terra aos homens de boa vontade, por Jesus Cristo que nasceu de Maria em uma estrebaria em Belém e que, envolvido em faixas, estava em uma manjedoura, Ele que é o Salvador do mundo.”