Deus é bom. Ele é bom com todos. Ele não mede com medidas humanas. Não faz diferença entre pecado e pecado mortal. O pecado o entristece, seja ele qual for. O arrependimento o faz ficar alegre e pronto para perdoar. A resistência à graça o torna inexoravelmente severo, porque a Justiça não pode perdoar ao impenitente, que morre assim mesmo com todos os auxílios que tiver recebido para que se convertesse.
Mas, nas conversões que falharam, se não a metade, pelo menos quatro décimos têm como causa primeira o descuido dos que estão à frente do trabalho de conversão, por um zelo mal entendido e mentiroso que, como um toldo descido sobre um real egoísmo e orgulho, pelos quais ficam eles tranquilos em seu próprio abrigo, sem descerem para o meio da lama, a fim de arrancar dela um coração. “Eu sou puro. Eu sou digno de respeito. Não vou aos lugares onde há corrupção moral, nem onde me podem faltar com a reverência.” Mas quem fala não assim ao acaso não leu o Evangelho naquele ponto onde está dito que o Filho de Deus veio para converter os publicanos e as meretrizes, além das pessoas honestas que assim o eram, ainda que somente segundo a Lei Antiga? Não pensará esse tal que o orgulho é uma impureza da mente, e que a falta de caridade é uma impureza do coração? Ficarás vilipendiado? Eu já o fui antes, e mais do que tu, e Eu era o Filho de Deus. Deverás andar com tuas vestes sobre as imundícies? E Eu, não toquei com as minhas mãos esta imundície, para pô-la de pé e dizer-lhe: “Caminha por este novo caminho”?
Não vos lembrais do que Eu disse aos vossos primeiros predecessores? “Em qualquer cidade ou vila em que entrardes, informai-vos sobre quem há nela que o mereça, e ficai na casa dele.” Isto, para que o mundo não fique murmurando. O mundo que é fácil demais para ver o mal em todas as coisas. Mas Eu acrescentei: “Ao entrardes nas casas, — ‘casas’, Eu disse, e não ‘casa’ — saudai-as dizendo: ‘Paz a esta casa’. Se a casa for digna, a paz virá sobre ela e, se não for digna, voltará para vós.” Isto é para ensinar-vos que, enquanto não houver uma prova certa de impenitência, deveis ter para com todos um mesmo coração. E Eu completei o ensinamento, dizendo: “E, se algum não vos recebe e não escuta as vossas palavras, ao sairdes daquelas casas e daquelas cidades, sacudi a poeira que ficou pegada à sola de vossos pés.” A fornicação nos bons, pelos quais a Bondade é constantemente amada, faz que eles sejam como um dado de vidro liso, e ela não é mais do que pó. Um pó que, basta que o sacudamos, ou que sopremos sobre ele, para que ele voe, sem deixar nenhuma lesão.
Sede verdadeiramente bons. Formai um só bloco, com a Bondade eterna no centro. E nenhuma corrupção será capaz de subir para vos sujar, a não ser nas solas de vossos pés, pois estão apoiados no chão. A alma fica muito ao alto. A alma de quem é bom e de quem é uma coisa só com Deus. A alma está no Céu. Até lá não chegam nem a poeira nem a lama, nem mesmo quando esta é jogada com ódio contra o espírito do apóstolo. A carne pode ferir-vos. Ferir-vos, quer dizer, materialmente, moralmente, perseguindo-vos, porque o Mal odeia o Bem, ou ofendendo-vos. E que tem isso? Eu não fui ofendido também? Não fui ferido? Mas será que aqueles golpes ou aquelas palavras obscenas ficaram gravadas em meu Espírito? Será que o perturbaram? Não. Será como uma cusparada lançada contra um espelho, ou como uma pedra jogada contra a polpa suculenta de uma fruta: deslizam sem conseguirem penetrar, ou penetram, mas somente na superfície, sem ferirem o germe que está dentro do caroço, e, pelo contrário, até o ajudam a nascer, porque é mais fácil sair para fora de uma massa já meio aberta, do que de uma completamente fechada. É morrendo que o grão germina e que o apóstolo produz. Morrendo materialmente, às vezes, morrendo quase diariamente, num sentido metafórico, porque com isso fica mais do que machucado o eu do homem. E isso não é morte: é Vida. Triunfa o espírito sobre a morte da humanidade.