Entretanto, o povo troca suas impressões. Até os que estão ao redor de Jesus criam coragem para falar, observando como Marziam, ao acabar de comer o seu peixe, vai brincar com os outros meninos.
– Mestre –pergunta o escriba–, por que o menino percebeu logo o peso, e nós não? Eu também apalpei o fundo do cesto. Sempre estavam lá aqueles poucos bocados de pão e aquele único de peixe. Eu comecei a sentir o peso, quando fui me dirigindo para o povo. Mas, se eu tivesse pesado o tanto que eu distribuí, teria sido necessária uma grande quantidade de pessoas só para transportá-lo, e já não em cestos, mas em carroças cheias, e bem cheias de alimento. No princípio, eu ia economizando… mas depois passei a dar cada vez mais e, para não ser injusto, tornei aos primeiros, dando-lhes outra vez, pois a eles eu tinha dado pouco. E, enfim, foi suficiente para todos.
– Eu também percebi que o cesto ficou pesado quando eu ia começar, e logo passei a distribuir maior quantidade, pois compreendi que tinhas feito um milagre –diz João.
– Pois eu parei, e sentei-me para despejar aquele peso, e olhar… E o que vi foi pão e mais pão. Então, pus-me a andar –diz Manaém.
– Eu também os contei, porque não queria ficar com menos. Eram cinquenta pãezinhos. Então, eu disse: “Vou dá-los a cinquenta pessoas, e depois voltarei para trás.” E os contei. Mas, quando cheguei aos cinquenta, o peso era o mesmo de antes. Então, olhei para dentro do cesto. Eram ainda muitos. Andei para a frente, e distribuí centenas. Eles não diminuíam nunca –diz Bartolomeu.
– Eu confesso que não acreditava, e tomei nas mãos os pedaços de pão e aquela migalha de peixe, e olhava para eles, dizendo: “mas, para que servem? Jesus quis fazer uma brincadeira!, e ficava olhando para eles. Olhava, estando escondido atrás de uma árvore, esperando, e não esperando ver se eles aumentavam. Mas continuavam sempre os mesmos. Eu já estava para voltar, quando Mateus passou, dizendo: “Já viste como são bonitos?” “O quê?”, disse eu. “Ora, os pães e os peixes!” “Não estás doido? Eu estou vendo sempre pedaços de pães.” “Vai distribuí-los com fé, e verás.” Joguei dentro do cesto aqueles poucos pedaços, e continuei, apesar da relutância… Depois… Perdoa-me, Jesus, porque sou um pecador –diz Tomé.
– Não. Tu és um espírito deste mundo. As tuas são razões mundanas.
– Eu também, então, Senhor. Tanto que eu pensava em dar uma moeda junto ao pão, pensando: “Eles irão comer em outro lugar” –diz Iscariotes–. Eu estava esperando, ao fazer assim, estar Te ajudando a ter uma melhor figura. Que é que serei eu, então? Serei como Tomé, e ainda mais?
– Muito mais que Tomé. Tu és mundo.
– Contudo, eu fiquei pensando fazer uma esmola para ser Céu! O dinheiro era meu mesmo…
– Esmola feita a ti mesmo, ao teu orgulho. E não esmola a Deus. Este último não tem necessidade dela, e a esmola feita a teu orgulho é culpa, e não mérito.
Judas inclina a cabeça e se cala.
– Eu, por minha vez, pensava que aquele bocado de peixe, que aquele bocado de pão, Tu terias devido reparti-lo mais, até que eles fossem suficientes. Mas eu não duvidava se teriam sido suficientes, nem por seu número, nem para alimentar o povo. Uma gota d’água, dada por Ti, pode ser mais nutriente do que um banquete –diz Simão Zelotes.
– E vós, que pensáveis? –pergunta Pedro aos primos de Jesus.
– Nós recordávamos de Caná… e não tínhamos dúvidas… –diz com seriedade Judas.
– E tu, Tiago, meu irmão, pensavas só nisso?
– Não, Eu pensava que fosse um sacramento, como Tu me disseste… É isso mesmo, ou estou errado?
Jesus sorri:
– É, e não é. A verdade do poder alimentício que há em uma gota d’água, como falou Simão, está unido o teu pensamento, por uma figura longínqua. Mas ainda não é um sacramento.