Os outros formaram dois grupos, que se alternam continuamente em sua estrutura, e estão em ebulição. E, de vez em quando, a voz rouca de Pedro, ou a baritonante de Tomé, se levanta com uma ressonância macabra. Depois essas vozes se abaixam, como se eles estivessem com medo do que estão dizendo. Discutem sobre o que terão que fazer, e um deles propõe uma coisa, e os outros, outras. Mas todas as propostas caem por terra, porque realmente “a hora das trevas” está para chegar, e os julgamentos dos homens ficam obscuros e confusos.
– Era preciso dizê-lo a mim, antes –diz, agastado, Pedro.
– Mas ninguém falou. Nem o Mestre… –diz André.
– Sim! É claro que Ele te diria. Mas, meu irmão! Parece que tu não o conheces!… –responde-lhe Pedro.
– Eu me sentia um tanto perturbado. E eu disse: “Vamos morrer com Ele”. Vós estais lembrados? Mas, pelo nosso Deus Santíssimo, se eu tivesse sabido que era Judas de Simão!… –troveja Tomé, ameaçador.
– E que irias fazer? –pergunta Bartolomeu.
– Eu? Eu o faria até agora, se me ajudásseis!
– Que farias? Partirias para ir matá-lo? E onde?
– Não. Eu levaria embora o Mestre. É mais simples.
– Ele não iria!
– Eu não lhe perguntaria se Ele viria. Eu o raptaria, como se rapta uma mulher.
– Não seria uma má ideia!… –diz Pedro.
E, impulsivo como ele é, vai lá para trás, se intromete no grupo dos dois filhos de Alfeu que, com Mateus e Tiago, estão conversando em voz baixa, como uns conjurados.
– Escutai. Tomé fala em levar embora a Jesus. Nós todos juntos. E se poderia… Do Getsêmani, por Betfagé, iríamos a Betânia, e de lá para qualquer outro lugar. Vamos fazer assim? Uma vez posto a salvo o Mestre, voltamos e acabamos com Judas.
– Inútil. Todo Israel é uma armadilha –diz Tiago de Alfeu.
– E a hora está para chegar. Já se sabia disso! O ódio é demais!
– Mas, Mateus! Tu me fazes ficar com raiva! Tinhas mais coragem quando eras pecador. Fala tu, Filipe.
Filipe, que vem chegando, e parece que vem conversando sozinho, levanta o rosto e para. Pedro vai ao encontro dele e começam a cochichar. Depois eles vão ao grupo de antes.
– Eu diria que o lugar melhor é no Templo –diz Filipe.
– Estarás ficando doido? –gritam-lhe os primos, Mateus e Tiago–. Mas se lá eles o querem morto?
– Psiu! Que barulho! Eu sei o que digo. Procurá-lo-ão por toda parte. Mas não lá. Tu e João tendes boas amizades com os servos de Anás. Damos um boa importância em dinheiro… E está tudo resolvido. Podeis crer! O melhor lugar para se esconder alguém que está sendo procurado é na casa dos carcereiros.
– Eu não faço isso –diz Tiago de Zebedeu–. Mas antes procura ouvir os outros. A João em primeiro lugar. Mas e se depois o prenderem? Não quero que se diga que fui eu o traidor…
– Eu não havia pensado nisso. E, então?
Pedro está abatido.
– Então, eu diria que é bom fazer uma coisa. A única que podemos fazer. Levar embora daqui a Mãe… –diz Judas do Alfeu.
– Está bem!… Mas quem é que vai fazer isso? Quem é que vai falar disso com ela? Vai tu, que és parente dela.
– Eu fico com Jesus. É meu direito. Vai tu.
– Eu? Eu estou armado com uma espada, para poder morrer como Eleazar de Saura. Eu passarei pelo meio de legiões para defender o meu Jesus e golpearei sem compaixão. Se a força dos outros me matar, não importa. Eu terei procurado defendê-lo –proclama Pedro.
– Mas tens certeza de que é mesmo Iscariotes? –pergunta Filipe a Tadeu.
– Disto eu estou certo. Nenhum de nós tem coração de serpente. Só ele… Vai tu, Mateus, à casa de Maria e dize-lhe…
– Eu? Para que enganá-la? Vê-la ao meu lado sem saber de nada, e depois?… Ah! Não. Estou pronto para morrer, mas não para trair aquela pomba…
As vozes se misturam com um sussurro.