Pelas conversas, entendo que, antes que tivesse início a visão, Jesus havia pregado e curado em Naim. Mas osfariseus e os escribas pouco se detêm sobre isso, enquanto estão enchendo de perguntas os que são de Naim para saber pormenores da doença de que havia morrido Daniel e quantas horas eram decorridas desde a hora da morte até a hora de sua ressurreição, e se ele tinha sido completamente embalsamado etc. etc.
Jesus se afasta de todas essas indagações falando com o ressuscitado, que está muito bem e come com grande apetite. Mas um fariseu chama Jesus, para perguntar-lhe se Ele tinha conhecimento de qual era a doença de Daniel.
– Eu estava vindo de Endor por pura casualidade, desejando contentar Judas de Keriot como havia contentado João Zebedeu. Eu não sabia nem mesmo que teria que passar por Naim, quando comecei o caminho para a peregrinação pascal –respondeu Jesus.
– Ah! Então, não tinhas ido de propósito para Endor –pergunta, espantado, um escriba.
– Não. Eu não tinha, então, a menor vontade de ir para lá.
– E, então, como é que foste?
– Eu já disse: porque Judas de Simão queria ir.
– E por que este capricho?
– Para ver a gruta da maga.
– Talvez Tu lhe tivesses falado…
– Não. Eu não tinha motivo.
– Eu quero dizer… talvez explicaste, junto com aquele episódio, outros sortilégios, para fazer a iniciação dos teus discípulos em…
– Em quê? Para iniciar na santidade não é preciso fazer peregrinações. Uma cela ou uma pradaria deserta, um pico de montanha ou uma casa solitária, servem do mesmo modo. Basta que em quem ensina haja austeridade e santidade, e em quem ouve, a vontade de santificar-se. É isto o que Eu ensino, e não outra coisa.
– Mas os milagres que agora fazem estes teus discípulos não são mais do que prodígios e…
– E vontade de Deus. Somente isto. E, quanto mais santos eles se tornarem, mais milagres farão. Com a oração, o sacrifício e a obediência deles a Deus. Não com outras coisas.
– Tens certeza disso? –pergunta um escriba, segurando o queixo com a mão e medindo a Jesus de alto a baixo com o seu olhar.
E o tom com que ele fala é discretamente irônico e até compassivo.
– Estas são as armas que Eu dei a eles e estas as doutrinas. Portanto, se entre eles, e são muitos, houver algum que se corromperá com práticas indignas, por soberba ou outros motivos, não será de Mim que eles terão recebido este conselho. Eu posso rezar para ver se redimo o culpado. Posso impor-me a mim mesmo duras penitências expiatórias para obter de Deus os auxílios, especialmente com as luzes de sua Sabedoria, para que se veja o erro. Eu posso jogar-me a seus pés, para suplicar-lhe, com todo o meu amor de Irmão, Mestre e Amigo, a fim de que deixe a culpa. Nem Eu pensaria estar me aviltando ao fazer isso, porque o preço de uma alma é tão grande, que vale a pena sofrer todas as humilhações para conquistá-la. Mais do que isso não posso fazer. E se, não obstante, a culpa continuar, o pranto e o sangue escorrerão dos meus olhos e de meu coração de Mestre e Amigo traído e incompreendido.
Que doçura, e que tristeza na voz e no aspecto de Jesus!
Escribas e fariseus olham-se uns aos outros. Fazem uma troca de olhares, mas não dizem mais nada sobre o assunto.