Simão Zelotes, que permanecera o tempo todo calado, também intervém:
– Eu não desejaria insinuar suspeitas. Mas, deixai que, para aliviar-vos o espírito, eu vos faça uma pergunta. É esta: estais bem certos de que nessa posição orgulhosa, tomada por Nazaré, não haja forças estranhas, vindas de fora, e que aqui trabalham bem na base de um elemento que deveria, se se raciocinasse com justiça, dar as melhores garantias para convencer a todos que o Mestre é o Santo de Deus? O conhecimento da vida santa de Jesus, cidadão de Nazaré, seria um motivo para tornar mais fácil aos nazarenos a aceitação dele como o Messias prometido. Eu, mais do que vós, e comigo muitos outros da minha idade em Nazaré, temos conhecido pelo menos pela fama, os pretensos Messias. E eu vos garanto que a vida íntima deles arrasava de uma vez a mais obstinada das afirmações da messianidade deles. Roma os perseguia ferozmente, como a rebeldes. Mas, deixando de lado o aspecto político, pois Roma não podia permitir que existissem, onde ela reina, esses falsos Messias que, por muitos motivos particulares, eram passíveis de punição. Nós os agitávamos e os sustentávamos, porque eles nos serviam para fomentar o nosso espírito de rebelião contra Roma. Nós os ajudávamos porque, obtusos como somos, passamos a acreditar, — até que enfim o Mestre veio esclarecer a verdade, e infelizmente, não tendo em conta isso, ainda não cremos, como devíamos, isto é, com uma fé total, — e passamos a ver em cada um deles o “rei” prometido. Eles acariciavam nosso espírito aflito, com esperanças de uma independência nacional e de uma reconstrução do reino de Israel. Mas, oh! que miséria! Que reino caduco e corrupto teria sido aquele?! Não. Porque, na verdade, chamar aqueles falsos Messias de reis de Israel, de fundadores do Reino prometido, era aviltar profundamente a idéia messianica. No Mestre, à profundidade se une a Santidade de Vida. E Nazaré, como nenhuma outra cidade, a conhece. Eu nem penso em fazer acusação da incredulidade dos nazarenos sobre o sobrenatural davida dele, que eles, os nazarenos, ignoram. Mas a vida! Mas a vida dele! Agora, tanto ódio, tão grande e impenetrável resistência… Mas, o que estou dizendo? Tão grande e aumentada resistência não poderia ter origem em manobras inimigas? Nós os conhecemos, os inimigos de Jesus. Sabemos o que valem. Credes vós que eles só aqui tenham ficado inertes ou ausentes se, por toda parte, ou eles foram à nossa frente ou a nosso lado ou atrás de nós, para destruírem a obra de Cristo? Não acuseis Nazaré, como se fosse a única culpada. Mas chorai sobre ela, extraviada pelos inimigos de Jesus.
– Falaste muito bem, Simão. Chorai sobre ela… –diz Jesus. E Ele está triste.
João de Endor observa:
– Falaste ainda muito bem, quando disseste que o elemento favorável se transforma em desfavorável, porque o homem raramente usa de justiça ao pensar. Aqui o primeiro obstáculo é o nascimento humilde, a infância humilde, a adolescência humilde, a juventude humilde de nosso Jesus. O homem se esquece de que os valores se ocultam sob aparências modestas, enquanto que as nulidades ficam camufladas como grandes seres, para se imporem às turbas.
– Assim será. Mas nada modifica o meu pensamento acerca dos meus concidadãos. Seja o que for que lhes possa ter sido dito, eles deviam saber julgar pelas obras reais do Mestre e não pelas palavras de desconhecidos.