Joana se deixa escorregar um pouco sobre a grama, e, meio sentada sobre os calcanhares, ficando mais abaixo em relação a Jesus, que está sentado em sua cadeira, em uma postura séria e rígida, distante dali, como um homem que estivesse a muitos metros de distância e diante de muitas obstáculos, mas perto como Deus e como Amigo, pela bondade do seu olhar e do seu sorriso. E olha, fica olhando para Ele Joana, neste crepúsculo suave de uma tarde de maio. Por fim, ela fala:
– Meu Senhor… antes de falar… eu preciso fazer-te uma pergunta, saber o que pensas… e compreender se eu sempre me enganei no modo de compreender as tuas palavras… Eu sou mulher, uma mulher tola… talvez eu estivesse sonhando… e só agora é que estou sabendo realmente das coisas… as coisas como Tu as disseste, como as preparaste, como as queres em teu Reino… Talvez Cusa tenha razão, e eu não.
– Cusa te censurou?
– Sim e não, meu Senhor. Somente ele me disse, com direito de marido, que, se for como os últimos fatos o fazem pensar, eu devo deixar-te, porque ele, alto dignitário de Herodes, não pode permitir que sua mulher conspire contra Herodes.
– E, quando foi que foste conspiradora? Quem é que está pensando em fazer mal a Herodes? O seu pobre trono, tão sujo, é menos do que esta cadeira entre os roseirais. Eu aqui me assento, mas lá não me sentaria. Que Herodes procure ficar tranquilo a respeito disso. Nem o trono de Herodes, nem mesmo o de César, despertam o meu desejo. Não são esses os meus tronos, nem esses os meus reinos.
– Oh! Sim, Senhor! Bendito sejas Tu. Quanta paz Tu me estás dando. Há dias que venho sofrendo por causa disso! Mestre meu, santo e divino, o meu caro Mestre, o meu Mestre de sempre, como eu te entendi, como te vi, te amei, como eu cri em Ti, tão alto, tão acima da Terra, tão… tão divino, ó meu Senhor e Rei celeste!
E Joana, tendo segurado a mão de Jesus, beija respeitosamente as costas dela, e fica de joelhos, em adoração.
– Mas, afinal, que foi que aconteceu? Alguma coisa que Eu não sei, capaz de perturbar-te assim, capaz de ofuscar em ti a limpidez da minha figura moral e espiritual? Fala!
– O quê? Mestre, as fumaças do erro, da soberba, da avidez, da obstinação, levantaram-se, como que de umas crateras fedorentas, e te ofuscaram no conceito de alguns, de algumas… E estavam já tentando fazer o mesmo comigo. Mas eu sou a tua Joana, a tua graça, ó Deus. E não me teria perdido, pelo menos eu assim espero, sabendo quanto Deus é bom. Mas quem não é mais do que um embrião de alma, que luta para formar-se, pode até morrer por uma decepção. Mas quem não é mais do que alguém que, de um mar de lama, perturbado por correntes violentas, tenta chegar até à praia, ao porto, purificar-se, conhecer outros lugares de paz, de justiça, bem pode ser dominado pelo cansaço, ao perder a confiança naquela praia, nestes lugares, e deixar-se levar pelas correntes, pela lama. E eu, por causa dessa ruína das almas, para as quais peço a tua Luz, me condoía, me torturava. As almas que nós formamos para a Luz eterna, nos são ainda mais queridas do que os corpos que nós damos à luz terrena. Agora eu o compreendo a diferença entre ser mães de uma carne e ser mães de uma alma. Chora-se por um filhinho nosso que morre. Mas é apenas nossa a dor. Por um espírito que procuramos criar na tua Luz, e que morre, sofremos, mas não por nós somente. Mas por Ti, com Deus… porque a nossa dor pela morte espiritual de uma alma é também uma dor para ti, uma dor infinita de Deus… Não sei se eu me explico bem…
– Oh! muito bem.